TODO AQUELE QUE CRÊ NUM DOGMA, ABDICA COMPLETAMENTE DE SUAS FACULDADES. MOVIDO POR UMA CONFIANÇA IRRESISTÍVEL E UM INVENCÍVEL MEDO DOENTIO, ACEITA A PÉS JUNTOS AS MAIS ESTÚPIDAS INVENÇÕES.

Quarta-feira, 07 de Abril de 2010

Como escreveu o Evangelista, Jesus veio para o que era seu, mas os seus não o receberam. Sua Mãe teve de deitá-lo numa manjedoura, porque não havia lugar para ele na hospedaria de Belém. O governante da Galiléia não vacilou em sacrificar toda uma geração de crianças, no intuito declarado de matá-lo. Na sua cidade de Nazaré, foi rejeitado pela sua gente. Os chefes de sua nação não se cansaram de lhe armar ciladas e provocações. Traído e caluniado, acabaram por lhe infligir prisão, abandono e suplícios, para afinal condená-lo e lhe dar morte humilhante. Sua doutrina de amor e paz foi ferozmente combatida, seus discípulos foram perseguidos, proscritos, atormentados e mortos.

A Luz Divina, porém, não seria derrotada. O Cristianismo a tudo resistiu, fortaleceu-se e espraiou-se com a rapidez de um raio. Depressa chegou a Roma, a toda a Ásia Menor, à Grécia, às Gálias e à África do Norte. Os textos evangélicos foram redigidos, a missão de Paulo universalizou os ensinos doutrinários, João recebeu e divulgou o Apocalipse ...

Soara a grande hora do advento da Civilização Cristã no mundo, com amplo aproveitamento da formidável infra-estrutura político-social do Império Romano. Embriagada, porém, de sangue e de prazer, de ouro e de ódio, de intolerância e de orgulho, Roma assumiu a infeliz posição de cruel perseguidora de Jesus. Sob Nero, os cristãos são espezinhados, torturados, entregues às feras e queimados nas praças. A árvore do mal começa então a dar os seus frutos de treva. O templo de Jerusalém é destruído pelos soldados de Flávio Sabino Vespasiano; os judeus são dispersos pelo mundo; os chineses submetem a Asia, até o Golfo Pérsico; o Vesúvio em erupção arrasa Herculano e Pompéia; hordas germanas invadem destruidoramente a Península Itálica; Artaxerxes vence os partas e funda o Império Neopersa. Nas hostes romanas, instalou-se a anarquia militar, cuja assustadora progressão levou Diocleciano a aceitar a divisão do Império Romano em Império do Oriente e Império do Ocidente (este último sob o poder de Maximiano) e a criar um sistema tetrárquico de governo, com dois césares (Galério e Constâncio) associados aos dois imperadores, de quem foram declarados sucessores.

Das terríveis lutas pelo poder, que a isso se seguiram, resultou a aliança de Valério Licínio (sucessor de Galério) com Constantino (sucessor de Constâncio) que derrotou Maximiano e venceu seu filho Maxêncio, morto este último na sangrenta batalha da Ponte Milvius.

Pelo Edito de Milão, os dois imperadores (Licínio, do Oriente, e Constantino, do Ocidente) asseguraram (Em 325, Constantino afastaria Licínio e reunificaria o Império) aos cristãos a sonhada liberdade de culto, levada mais tarde a extremos pelo imperador Teodósio que, em 381, tornou o Cristianismo religião oficial do Império e proibiu os demais cultos em todos os territórios romanos. Desse conúbio entre os interesses do Império e da Igreja nasceu o Catolicismo, cujo voraz apetite de riqueza e de poder e cujos pomposos rituais, refertos de ostentação e de paganismo, deturparam a simplicidade do Evangelho e traíram a mensagem sublimal do Espírito do Cristo. Quando esse trevoso processo de desfiguração do Cristianismo atingiu o auge, o Poder Celeste, depois de esperar 400 anos, decidiu pôr um fim definitivo à glória e à força da poderosa Roma Imperial.

Godos, francos, suevos, saxões, álanos, anglos, vândalos e burgúndios começaram a pilhar os territórios romanos. Tangidos pelos hunos, que flagelavam as Gálias, os visigodos invadiram vastas áreas orientais do Império, devastaram extensas regiões da Grécia e da Itália e, em 410, saquearam a própria cidade de Roma. Em 455 foi a vez dos vândalos pilharem a grande e já então infeliz metrópole, cujo Império acabou por ruir fragorosamente em 476, quando o hérulo Odoacro depôs Rômulo Augústulo, o último imperador romano do Ocidente. Iniciava-se então a Idade Média.

Ante a falência do Império Romano e da Igreja Católica, as Potências do Céu decidiram que a Civilização Ocidental devia ser reconstruída. No esforço de preparar o advento de uma nova era, grandes missionários de Jesus foram enviados à Terra, para regenerar o Cristianismo e reavivar a chama sagrada da fé. Dois dentre esses missionários eram elevadas expressões de capacidade realizadora, que efetivamente se destacaram pela sua ação, de largas conseqüências. Referimo-nos ao grande Bento, nascido em Nursia, em fins do século V, cuja Ordem conseguiu conquistar para o Cristo grande número de bárbaros, principalmente entre os germanos, e o árabe Maomé, nascido em Meca, no ano 570. Infelizmente, o Profeta do Islã não conseguiu vencer as tentações do poder humano e, falhando nos sagrados compromissos assumidos para com o Cristo, deixou no mundo uma doutrina cuja violência e intolerância levariam os árabes a tentar, pela força, o domínio do mundo.

Enquanto isso, e ao fim de intensas lutas, os invasores bárbaros se estabeleceram definitivamente nas terras do extinto Império Romano do Ocidente. Os lombardos instalaram-se na Península Itálica; os anglos e os saxões dominaram a Grã-Bretanha; os francos, após vencerem os borgúndios, se apossaram da Gália. Com o tempo, todos esses povos acabaram por aderir ao Cristianismo, a começar pelos francos, cujo rei, Clóvis, casado com a princesa cristã Clotilde, prometeu abraçar a religião cristã se vencesse, em 496, os alamanos, e foi solenemente batizado por D. Remígio, o bispo de Reims. Sob Clóvis, fundador da dinastia dos Merovíngios, a antiga Gália passou a chamar-se França.

Nomeado pelo próprio Maomé, seu genro, supremo chefe reliigioso, político e militar dos muçulmanos, Abu-Bekr iniciou, com o auxílio do grande general Omar, de Otmã, Ali e Mohaviah, a "Guerra Santa" contra os "infiéis". Revelando extraordinária combatividade e grande perícia guerreira, os islamitas obtiveram, de imediato, êxitos marcantes. Antes do ano 700, já dominavam todo o litoral norte-africano e, em 711, sob o comando do General Tariq Ibn Ziyad, atravessaram o estreito de Gibraltar, conquistaram quase toda a Ibéria e, se não fosse a vitória de Carlos Martel, em 732, na batalha de Poitiers, teriam também submetido a França.

O Império Árabe chegou a ser tão grande que, além da Arábia, abrangia toda a Síria, a Mesopotâmia, a Pérsia, parte do norte da Índia, ilhas do Oceano Índico, a Armênia, o Turquestão, o Egito, a África do Norte, e quase toda a Espanha.

Como a incapacidade e a indolência houvessem passado a caracterizar, desde muito, os descendentes de Clóvis, estes acabaram perdendo o trono para o filho de Carlos Martel, Pepino-o-Breve, cujo sucessor, Carlos Magno, se dedicou a criar, na Europa, um grande império cristão. Depois de conquistar quase todos os terrritórios que integram atualmente a França, as Alemanhas, a Áustria, a Hungria, a Tchecoslováquia e a Itália, recebeu das mãos do Papa Leão III, no Natal do ano 800, a coroa e o título de Imperador do Ocidente.

Esboça-se então, como por encanto, a revivescência do antigo Império Romano, com a perspectiva de ser alcançada a unidade político-administrativa da Eurásia e do conseqüente estabelecimento de um só governo central. Essa expectativa, porém, durou bem pouco, porque com a desencarnação do Imperador Luís, sucessor de Carlos Magno, o Tratado de Verdun, celebrado em 843, efetuou o desmembramento do Império. Luís, o Germânico, ficou com a Alemanha; Carlos, o Calvo, com a França; Lotário, com a Lotaríngia, que abrangia, entre outras, as regiões que constituem hodiernamente a Holanda, a Suíça, quase toda a Itália e a região da Alsácia-Lorena.

Abrimos aqui um rápido parêntese para lembrar que os povos gregos, a quem tanto deve a Humanidade, os latinos, que organizaram o Império Romano, os celtas, os eslavos e os germanos eram, todos eles, povos formados por aqueles mesmos Espíritos que, partindo da Ásia, em tempos remotos, na alvorada das civilizações terrestres, atravessaram os planaltos pérsicos e se espalharam do Báltico ao Mediterrâneo. De todos os exilados de Capela, eram eles os mais revoltados e os menos afeitos à religiosidade, mas eram também os menos preconceituosos e os mais abertos à confraternização com os "filhos da Terra", que por aqui encontraram. Eles criaram as bases democráticas da organização política dos povos ocidentais; sistematizaram a agricultura, o pastoreio e o comércio, e, com a sua inteligência inquieta e fecunda, lançaram os fundamentos da Ciência e a fizeram evoluir até as magnificências de hoje em dia.

Voltemos, porém, a considerar a situação reinante no mundo. No fim do século IX, a Civilização Khmer conheceu a sua idade de ouro. Com capital em Ankor, dominava as vastas regiões onde hoje se situam o Laos, o Camboja, a Tailândia e o Sul do Vietnam. No século X, a Lorena foi anexada à Alemanha e Henrique-o-Passarinheiro fundou o Império Germânico. Córdoba, sob o califado de Abdu-al-Rahman lI, tornou-se o centro da cultura árabe na Europa. Na China, Tai-tsu fundou a dinastia Sung, que governaria até 1279. Foi inventada a pólvora. Oto I, o Grande, fundou, em 962, o Sacro-Império Romano-Germânico, que unia a Itália à Alemanha.

No século XI, Canuto lI, da Dinamarca, tornou-se rei da Inglaterra e da Noruega. Henrique III, do Sacro-Império, dominou a Hungria, a Polônia e a Boêmia. Em 1054, deu-se o Cisma de Miguel Cerulário, Patriarca de Constantinopla, que resultou na separação das Igrejas Bizantina e Romana, que reciprocamente se excomungaram. Em 1066, os normandos conquistaram a Inglaterra e, em 1085, Alfonso VI tomou Toledo e começou a expulsar os árabes da Espanha.

Reconhecendo que a Igreja de Roma havia-se tornado o mais importante centro de poder político do mundo, as Potências Celestes empreenderam, mais uma vez, considerável esforço para promover a regeneração de suas estruturas, àquela altura profundamente corroídas por todos os tipos de descalabro moral e de mercantilismo simoníaco. Para esse fim, as Forças do Bem utilizaram o que restava de dignidade na Ordem Beneditina, que recebeu então o apreciável reforço de numerosos Espíritos, encarnados para a tarefa especifica de fazer dela poderoso fulcro de restauração do verdadeiro Cristianismo. É nesse contexto que se inserem, dentre as nobres missões por muitos desempenhadas, a do Papa Gregório VII, cujos méritos e cuja grandeza espiritual superam todos os aspectos menos felizes de sua atuação humana, ao longo de um pontificado que se desenvolveu de 1073 a 1085.

Nessa época, os guerreiros turcos se haviam apossado de Jerusalém e de toda a Palestina, maltratando os peregrinos cristãos que os árabes sempre haviam recebido sem problemas na "Terra Santa". Pedro, o Eremita, reagindo àqueles maltratos, que ele próprio havia experimentado, começou a percorrer a Europa, pregando a guerra contra os infiéis.

Sensibilizado pelo clamor de revoltadas multidões de católicos, o Papa Urbano II convocou grande concilio em Clermond-Ferrand e sancionou, com a sua pontifical autoridade, a organização de expedições militares contra os islamitas. Era o começo das Cruzadas, de tão assinaladas conseqüências na história dos povos.

Após a primeira e desastrada expedição, chefiada pelo próprio Eremita, quatro grandes grupos armados reuniram-se em Constantinopla, em 1096, e rumaram para os Lugares Santos. A maior parte dos expedicionários nunca chegou ao seu destino, porque numerosos fidalgos, tirando proveito pessoal das vitórias que iam obtendo pelo caminho, preferiram dedicar-se a conquistar para si mesmos terras férteis e ricas que encontravam. Ainda assim, o aguerrido exército que, sob o comando de Godefroy de Bouillon, vencera Nicéia e Antioquia, apoderou-se de Jerusalém.

Valendo-se, porém, das desgastantes disputas que travaram entre si os conquistadores cristãos, os muçulmanos recuperaram, em 1147, a cidade de Edessa e ameaçaram apoderar-se de novo dos demais territórios que haviam perdido. Diante disso, o Papa Eugênio III, promoveu nova Cruzada, sob as ordens de Conrado lII, da Alemanha, e de Luís VII, da França, que durou de 1147 a 1149 e redundou em tão grande fracasso militar que, poucos anos depois, em 1187, o grande sultão Saladino reconquistou Jerusalém.

Reagindo a esse desastre, os três mais poderosos soberanos católicos da Europa - Ricardo Coração de Leão, da Inglaterra, Frederico Barbarroxa, da Alemanha, e Filipe Augusto, da França - decidiram lançar-se a uma terceira Cruzada contra os maometanos; mas, desunidos pelo orgulho e incapazes de somar as próprias forças, resolveram enfrentar separadamente as hostes de Saladino, que os venceu um a um. Frederico Barbarroxa morreu ao tentar a travessia duma corredeira. Ricardo Coração de Leão, aprisionado por seu inimigo Leopoldo, da Áustria, amargou exílio e prisão por longos anos.

A quarta Cruzada desviou-se inteiramente de suas finalidades. Ao invés de combater os muçulmanos, apoderou-se, em 1204, do Império Romano do Oriente, em cujo lugar estabeleceu o Império Latino, sob a égide de reis de ascendência francesa. Logo, porém, em 1262, uma revolta restabeleceu o antigo Império Romano do Oriente.

Houve ainda uma quinta, uma sexta, uma sétima e uma oitava Cruzadas, que terminaram, todas elas, em ruidosos fracassos. As duas últimas foram levadas a efeito por Luís IX, da França, que na sétima foi aprisionado pelos turcos e depois libertado mediante pagamento de pesado resgate. No início da oitava, o rei desencarnou, em Túnis, vítima de epidemia.

Consagrando a violência como arma da fé, em absoluto desacordo com o espírito do vero Cristianismo, as Cruzadas não atingiram os fins a que se propuseram e resultaram em completo desastre militar. Apesar disso, a Sabedoria Celeste aproveitou ao máximo, em favor da Humanidade, o que esses grandes movimentos bélicos foram capazes de criar de bom. Se recordarmos rapidamente qual era a situação da Europa no início do século IX, logo nos daremos conta de que a política de Carlos Magno havia instituído as bases do feudalismo medieval, ao confirmar no poder os seus vassalos, mas lhes impondo a sua imperial autoridade através dos famosos "enviados do senhor".

Os sucessores do grande imperador não tinham, porém, nem de longe, o seu talento, nem a sua força, e, morto ele, os fidalgos, que mais não eram do que chefes guerreiros (ou os seus herdeiros) travestidos de nobres, embora respeitassem, por conveniência própria, as hierarquias formais do poder, passaram a governar os seus feudos como senhores incontestados e absolutos. Despóticos e preguiçosos, completamente despreocupados de seus povos e sem qualquer compromisso com o progresso, seu imobilismo administrativo resultou, a curto prazo, na mais desoladora estagnação da economia, na ociosidade generalizada, na ignorância e no pauperismo das massas.

O contato dos cruzados com o luxo e o conforto dos potentados muçulmanos despertou nos europeus um novo e forte desejo de regalos que dantes ignoravam e que custavam fortunas só adquiríveis através do trabalho produtivo e fecundo. Foi assim que, para conseguir açúcar, cravo, baunilha, pimenta, canela, sofás, almofadas e divãs, sedas e tapetes, aqueles fidalgos, antes ociosos, voltaram aos seus domínios com novas disposições, sem dúvida egoístas, mas que devolveram aos povos europeus a bênção do trabalho, e, com ela, considerável melhora nas condições de vida das populações, amplamente beneficiadas pelo vigoroso crescimento da indústria e do comércio.

Ao lado disso, os cruzados também trouxeram para a Europa muitos livros esquecidos ou desconhecidos no Velho Mundo, até mesmo pelas elites clericais; livros que os árabes haviam traduzido dos gregos, e outros que eles próprios haviam produzido, versando sobre astronomia, medicina, geografia e matemática. Para que se possa medir, de algum modo, a importância disso, deve-se compreender que, sem esse trabalho dos árabes, descoberto e aproveitado pelos europeus, provavelmente não houvessem surgido, nos séculos XIII e XIV, as primeiras universidades européias, que tão esplêndidos serviços iriam prestar à Humanidade; e nem houvessem surgido tão brilhantemente, no firmamento da cultura humana, pensadores como Tomás de Aquino e Rogério Bacon, e poetas do talento de Dante e de Petrarca.

Além desses magnos benefícios, não devemos esquecer que populações inteiras se alforriaram, comprando a própria liberdade a tiranos necessitados de dinheiro. Isso trouxe uma conseqüência política de extraordinária significação, na medida em que o fortalecimento do poder central dos monarcas abalou definitivamente as bases do feudalismo.

Entretanto, nada disso obscurece a verdade de que o panorama do mundo era tão sombrio, nos inícios do século XI, que, nas regiões mais elevadas do arcabouço planetário, o Colégio Crístico determinou a encarnação em massa de um verdadeiro exército de tarefeiros do bem, para sustentar a chama sagrada do ideal evangélico, ameaçada pela terrivel ventania de violência e depravação que varria a Terra. Por isso, enquanto os dignitários da Igreja e os senhores feudais erguiam taças e espadas, em nome de Deus, abnegados penitentes davam, nos mosteiros, nas vilas e nos campos, os mais santos exemplos de piedade e amor cristão. Notabilizaram-se nisso os albigenses e os valdenses, cujo zelo apostolar provocou cruéis perseguições de insensatas autoridades humanas.

Ante tão lamentáveis descalabros e tão profunda deturpação dos ensinos do Divino Mestre, o grande Vidente de Patmos ofereceu-se a Jesus para voltar ao mundo, numa veste de carne, a fim de recordar, com o seu exemplo de amor e de pobreza, as lições imortais do Nazareno. Assim foi que nasceu em Assis, em 1182, o seráfico Francisco, cuja pureza e cuja doçura impregnariam para sempre as paisagens itálicas.

A reação das forças negrejantes foi imediata, e já no ano seguinte, 1183, o Concílio de Verona lançava as bases eclesiásticas da Inquisição, que levaria, daí a vinte e três anos, à fundação da Ordem Dominicana dos Irmãos Pregadores. E como as ameaças e as prisões não houvessem bastado para calar a voz dos albigenses, o próprio Pontífice Romano pediu, em 1209, que se organizassem, contra eles, campanhas militares. Mas nesse mesmo ano de 1209, enquanto as primeiras expedições punitivas eram movidas contra os cristãos de Albi, Francisco fundava, na Úmbria, a Ordem dos Irmãos Menores, para o exercício da mais completa humildade e da mais absoluta pobreza.

O exemplo dos franciscanos não comoveu, porém, o espírito belicoso dos príncipes e dos clérigos, e três anos após a desencarnação do Pobrezinho, as milícias do tenebroso Simão de Monfort perpetraram, contra os albigenses, o massacre de 1229, que os exterminou.

Longe de se satisfazerem com esse sanguinário triunfo, os áulicos do Anticristo trataram de ampliar e consolidar o domínio da Treva sobre as consciências, e dois anos depois, em 1231, o Papa Gregório IX organizou o primeiro Tribunal de Inquisição, cujo funcionamento confiou ao zelo dos frades dominicanos.

As Potências do Bem, entretanto, não desanimaram, e outros insignes missionários de Jesus desceram à Terra, criando novos movimentos de regeneração do Cristianismo. Foi pena que, depois da violenta crise que se instalou na Igreja, em 1309, dando lugar ao que ficou conhecido como o "cativeiro de Babilônia", com a sede do Papado transferida, por Clemente V, para a cidade de Avinhão, outra crise maior espocasse na Europa, em 1337, batizada de "Guerra dos Cem Anos". Não fosse a grande luz projetada por brilhantes Espiritos, como Wicleff, João Huss, Jerônimo de Praga e Joana d'Arc, talvez nos sentíssemos tentados a dizer que as trevas espirituais dominavam, por inteiro, o Velho Mundo.

Também o Império Romano do Oriente, ou Império Bizantino, que tão valentemente se mantivera até então, prestando assinalados serviços à cultura humana, acabou capitulando para sempre, ante as hordas poderosas do califa Maomé II, que entrou vitoriosamente em Constantinopla no dia 29 de maio de 1453. Naquela data, enquanto Dragases defendia, até morrer, a capital do Império, os frades de Bizâncio, alheios à realidade, travavam discussões acaloradas e estéreis, que passaram à História como "discussões bizantinas".

Com as fogueiras que queimaram vivos João Huss, em 1415; Jerônimo de Praga, em 1416, e Joana d'Arc, em 1431; e com a queda de Constantinopla, em 1453, ruiu o mundo antigo; mas quando Colombo e Cabral, no último decênio do século, chegaram às terras americanas, abrindo a cortina do tempo, surgiram, como por encanto, no cenário humano, um mundo novo e uma nova era.

"É então -escreve Emmanuel, em seu precioso livro "A Caminho da Luz" - que inúmeros mensageiros de Jesus, sob a sua orientação, iniciam largo trabalho de associação dos Espíritos, de acordo com as tendências e afinidades, a fim de formarem as nações do futuro, com a sua personalidade coletiva. A cada uma dessas nacionalidades seria cometida determinada missão no concerto dos povos futuros, segundo as determinações sábias do Cristo, erguendo-se as bases de um mundo novo, depois de tantos e tão continuados desastres da fraqueza humana. Constroem-se os alicerces dos grandes países como a Inglaterra, que, em 1258, organiza os Estatutos de Oxford, limitando os poderes de Henrique III, e em 1265 erige a Câmara dos Comuns, onde a burguesia e as classes menos favorecidas têm a palavra com a Câmara dos Lordes. A Itália prepara-se para a sua missão de latinidade. A Alemanha se organiza. A Península Ibérica é imensa oficina de trabalho e a França ensaia os passos definitivos para a sabedoria e para a beleza. A atuação do mundo espiritual proporciona à história humana a perfeita caracterização da alma coletiva dos povos. Como os indivíduos, as coletividades também voltam ao mundo pelo caminho da reencarnação. É assim que vamos encontrar antigos fenícios na Espanha e em Portugal, entregando-se de novo às suas predileções pelo mar. Na antiga Lutécia, que se transformou na famosa Paris do Ocidente, vamos achar a alma ateniense nas suas elevadas indagações filosóficas e científicas, abrindo caminhos claros ao direito dos homens e dos povos. Andemos mais um pouco e acharemos na Prússia o espírito belicoso de Esparta, cuja educação defeituosa e transviada construiu o espírito detestável do pangermanismo na Alemanha da atualidade. Atravessemos a Mancha e deparar-se-nos-á na Grã-Bretanha a edilidade romana, com a sua educação e a sua prudência, retomando de novo as rédeas perdidas do Império Romano, para beneficiar as almas que aguardaram, por tantos séculos, a sua proteção e o seu auxílio."

Surgem, na Europa, a pólvora, a imprensa, o papel, a bússola.

Vasco da Gama chega a Calicut, na índia; Fernão de Magalhães encontra a "passagem para o Oriente", atingindo, por mar, as Filipinas; e Sebastião Elcano, ao regressar à Espanha, em 1522, prova a redondeza da Terra. De repente, o Velho Mundo, em primavera, se enche de beleza. Pensadores, astrônomos, poetas, físicos, pintores, escultores e matemáticos parecem ter descido à Terra, para nela materializarem alguma coisa do Céu! É o momento radioso de Da Vinci e Miguel Ângelo; de Rafael, de Velásquez, de Murilo; de Rubens e Van Dyck; de Bramante e de Rembrandt; de Ariosto, de Tasso, de Rabelais e de Montaigne; de Cervantes e Camões; de Morus e de Erasmo; de Kepler, Galileu e Shakespeare; de Copérnico, Torricelli, Harvey e Leibniz, de Descartes e de Newton ...

É também a grande hora de Martinho Lutero, de Teresa de Ávíla e João da Cruz; de Zwínglio, de Calvino e de Melanchton; de Servet e João Knox; embora seja também, desgraçadamente, o tempo e a vez de Inácio de Loyola, de Felipe lI, de Leão X, de Paulo III, de Catarina de Médicis e de Las Casas, o bispo escravocrata.

Chega, porém, o século XVII, com os horrores da Guerra dos Trinta Anos, mas os emigrantes do Mayflower desembarcam na América; Pedro-o-Grande ocidentaliza, de algum modo, a Rússia; é assinada, na Inglaterra, a "Declaração de Direitos"; a independência da Holanda e da Suíça é reconhecida e a França se torna a primeira potência militar da Europa.

"O século XVIII iniciou-se entre lutas igualmente renovadoras - comenta Emmanuel, no livro já citado -, mas elevados Espíritos da Filosofia e da Ciência, reencarnados particularmente na França, iam combater os erros da sociedade e da política, fazendo soçobrar os principios do direito divino, em nome do qual se cometiam todas as barbaridades. Vamos encontrar nessa plêiade de reformadores os vultos veneráveis de Voltaire, Montesquieu, Rousseau, D'Alembert, Diderot, Quesnay. Suas lições generosas repercutem na América do Norte, como em todo o mundo. Entre cintilações do sentimento e do gênio, foram eles os instrumentos ativos do mundo espiritual, para regeneração das coletividades terrestres. Historiadores há que, numa característica mania de sensacionalismo, não se pejam de vir a público asseverar que esses espíritos estudiosos e sábios se encontravam a soldo de Catarina II da Rússia, e dos príncipes da Prússia, contra a integridade da França; mas semelhantes afirmativas representam injúrias caluniosas que apenas afetam os que as proferem, porque foi dos sacrifícios desses corações generosos que se fez a fagulha divina do pensamento e da liberdade, substância de todas as conquistas sociais de que se orgulham os povos modernos."

A independência dos Estados Unidos da América, proclamada no dia 4 de julho de 1776 e reconhecida pela Inglaterra no dia 3 de setembro de 1783, teve na França profunda repercussão. A Declaração de Filadélfia era candente e inspiradora: - "Consideramos como evidentes as seguintes verdades: que todos os homens foram criados iguais; que o Criador lhes conferiu certos direitos inalienáveis, dentre os quais contam-se a vida, a liberdade e a procura da felicidade; que, para assegurar esses direitos, os governos foram instituídos entre os homens, originando-se os seus justos poderes do consentimento dos governados ... "

Quando os "Estados Gerais" se reuniram, por convocação do rei, a instâncias do Ministro Necker, os deputados da burguesia propuseram reformas políticas tão radicais, que o rei, partilhando o receio dos nobres, mandou fechar o local das sessões. Desobedecendo à ordem, os deputados proclamaram-se em Assembléia Constituinte. O governo recorreu a mercenários estrangeiros para manter a ordem em Paris, mas a fome do povo, o desemprego, a inconformação com as injustiças sociais e com os privilégios dos nobres e do clero; as novas idéias plantadas pelos enciclopedistas e o exemplo dos norte-americanos; tudo isso - passionalmente ressaltado nos inflamados discursos de Desmoulins - levou a multidão revoltada a invadir a fortaleza da Bastilha, enquanto por todo o país os castelos dos nobres eram incendiados. Estávamos no dia 14 de julho de 1789; era a Revolução Francesa; era o começo da Idade Contemporânea.

Os acontecimentos se precipitaram. Em 1792, a Convenção (conselho eleito pelo povo) proclamou a República. A 12 de janeiro de 1793, Luís XVI foi guilhotinado. O Terror, comandado por Robespierre, estabeleceu-se na França.

A guerra contra a Austria e a Prússia, iniciada em 1792, logo se estendeu a toda uma coligação européia de nações, mas os exércitos franceses, organizados por Carnot e comandados por Roche, Moreau e Jourdan, acumulavam vitórias sucessivas. Foi então que um jovem oficial corso começou a ganhar notoriedade, ao reconquistar brilhantemente dos ingleses a cidade fortificada de Toulon. Em breve, seu nome ganharia fama e prestígio, na França e em toda a Europa, pela eficiência do seu comportamento na repressão ao levante monarquista e pela excelente campanha militar que desenvolveu contra os austríacos no norte da Itália. Os triunfos que obteve em Lodi, em Arcole, em Rívoli e em Castiglioni elevaram Napoleão Bonaparte à categoria de grande guerreiro e herói nacional da França. A "Paz de Campofórmio" foi o resultado incontestável de seu gênio de estrategista. Passando depressa ao Egito, conseguiu, junto às Pirâmides, memorável vitória, mas encontrou depois dificuldades muito grandes, que sua astúcia política soube disfarçar com muito êxito, através de notícias constantes de fantasiosas conquistas, que fazia espalhar na metrópole distante. Para os franceses, seu nome passou a ser, naturalmente, a radiosa esperança de um governo poderoso e honesto, em substituição aos escândalos administrativos de um Diretório incompetente e corrompido. Aconselhado por Talleyrand, Fouché e Sieyés, e mantendo suas tropas na Africa, foi incógnito a Paris e lá, agindo com o apoio dos militares e de alguns políticos insatisfeitos e influentes, dissolveu os Conselhos, destituiu o Diretório e, no Dezoito Brumário - 9 de novembro de 1799 -, assumiu o poder, com O título de Primeiro-Cônsul.

Portando-se com extraordinária sagacidade política e sem nenhum escrúpulo humanitário, Bonaparte conseguiu, em pouco tempo, enriquecer a França, às custas da Europa. Prosseguindo sem descanso em sua faina guerreira, impunha sistematicamente aos vencidos tratados de comércio que recheavam as bolsas dos negociantes e produtores franceses. Sua administração deu ao seu povo inegável prosperidade econômica, excelentes estradas e um Código Comercial modelar. Além disso, sua sensibilidade de estadista devolveu à população, sob a garantia do Estado, plena liberdade de culto, e restabeleceu o calendário cristão, que a Revolução abolira. Tudo isso talvez não justifique, mas provavelmente explicará por que os franceses, que haviam empreendido sangrenta revolução para substituir a monarquia absoluta por uma república igualitária, aplaudiram com entusiasmo a Napoleão Bonaparte, quando ele, depois de tornar-se Cônsul Vitalício, fez o Papa viajar do Vaticano para a França, a fim de o sagrar Imperador.

A verdade é que, deixando-se vencer por ambiciosa vaidade, aquele Espírito de escol não soube realizar a elevada missão de congraçar e liderar os povos europeus, inaugurando nova era de confraternização e paz para o mundo inteiro. É certo que o Código Civil, que deu à França, foi luminoso presente outorgado a toda a Humanidade, por sua feliz contribuição ao progresso do direito social dos povos; mas a sua sede de absolutismo comprometeu todo o programa que o Plano Superior da Vida tão trabalhosamente montara em favor de todos os homens. Desguarnecido do favor celeste que dolorosamente desmereceu, o grande cabo de guerra teve de amargar a terrível derrota de Trafalgar, a tragédia da campanha militar na Rússia e o golpe final de Waterloo.

Enquanto esses acontecimentos se desdobravam no Velho Mundo, o Novo Mundo se emancipava e organizava. Desde os últimos anos do século XVIII, movimentos de libertação espocavam no continente, liderados por Joaquim José da Silva Xavier, no Brasil; Manuel Belgrano e Mariano Moreno, no Prata; Bernardo O'Higgins, nos Andes; Artigas, Lavalleja e Rivera, na Cisplatina; Hidalgo e Morelos, no México; Toussaint-Louverture e Jacques Dessaline, no Haiti; Miranda, em Nova Granada. A independência política não tardou a coroar os sonhos de liberdade dos centro e sul-americanos, muitos deles liderados pelos extraordinários campeões que foram Bolívar e San Martin. Em menos de dez anos, de 1816 a 1825, emanciparam-se o Haiti (1804), o Paraguai (1813), a Argentina (1816), o Chile (1818), o Brasil, o México e Nova Granada (1822), Guatemala, San Salvador, Honduras, Costa Rica e Nicarágua (1823) e a Bolívia (1825).

O grande Espírito do Apóstolo Tomé já estava, a esse tempo, no mundo, onde reencarnou a 3 de outubro de 1804, com a excelsa missão de codificar o Espiritismo. Ele não vinha só. Como assinala Emmanuel, no livro já citado, "fazia-se acompanhar de uma plêiade de companheiros e colaboradores, cuja ação regeneradora não se manifestaria tão-somente nos problemas de ordem doutrinária, mas em todos os departamentos da atividade intelectual do século XIX." E acrescenta: - "A Ciência, nessa época, desfere os vôos soberanos que a conduziriam às culminâncias do século XX. O progresso da arte tipográfica consegue interessar todos os núcleos de trabalho humano, fundando-se bibliotecas circulantes, revistas e jornais numerosos. A facilidade de comunicações, com o telégrafo e as vias férreas, estabelece o intercâmbio direto dos povos. A literatura enche-se de expressões notáveis e imorredouras. O laboratório afasta-se definitivamente da sacristia, intensificando as comodidades da civilização. Constrói-se a pilha de coluna, descobre-se a indução magnética, surgem o telefone e o fonógrafo. Aparecem os primeiros sulcos no campo da radiotelegrafia, encontra-se a análise espectral e a unidade das energias físicas da Natureza. Estuda-se a teoria atômica e a fisiologia assenta bases definitivas com a anatomia comparada. As artes atestam uma vida nova. A pintura e a música denunciam elevado sabor de espiritualidade avançada. A dádiva celestial do intercâmbio entre o mundo visível e o invisível chegou ao planeta nessa onda de claridades inexprimíveis. Consolador da Humanidade, segundo as promessas do Cristo, o Espiritismo vinha esclarecer os homens, preparando-lhes o coração para o perfeito aproveitamento de tantas riquezas do Céu."

Entrementes, os Estados Unidos da América do Norte dedicavam-se a um vasto programa de expansão territorial, tendo incorporado a Luisiana, o Texas, o Novo México, a Califórnia e o Alasca. Seu progresso era rápido e consistente, mas os problemas internos eram grandes, provocados pelas rivalidades econômicas entre os Estados do Norte, industrializados, e os Estados do Sul, essencialmente agrícolas; e pela questão da escravatura. A crise tornou-se tão aguda que, em 1861, a declaração separatista da Carolina do Sul desatou a Guerra de Secessão, que se prolongaria até que as batalhas de Gettysburg, em 1863, e Appomatox, em 1865, decidiriam a sorte das armas a favor dos federados. Por esse triunfo, que foi, acima de tudo, a vitória da fraternidade e da justiça, pagou com a própria vida o grande Abraão Lincoln, covardemente assassinado pelo fanático Booth.

Também no sul do continente surgiram dificuldades e conflitos sangrentos. O Brasil, o Uruguai e a Argentina se envolveram, de 1851 a 1852, na chamada "Guerra de Rosas", e depois, de 1864 a 1870, na "Guerra do Paraguai". De 1879 a 1883, a conflagração entre o Chile, o Peru e a Bolívia gerou problemas até agora não de todo solucionados, o mesmo acontecendo, anos mais tarde, quando a "Guerra do Chaco" pôs em confrontação a Bolívia e o Paraguai.

A derrota de Napoleão havia levado à reorganização da Europa.

Sob a influência poderosa de Metternich, o Congresso de Viena, reunido de 1814 a 1815, remarcou fronteiras, restaurou o domínio das famílias reais que a Revolução Francesa e Bonaparte destronaram e deu origem à famigerada Santa Aliança, que tão maus serviços prestou aos ideais democráticos dos povos, e à Confederação Germânica, formada por todos os Estados alemães, exceto o Império Austro-Húngaro.

A França, porém, que tantas dívidas cármicas contraíra, teria de suportar, na conformidade da lei de justiça divina, ou lei de causa e efeito, uma longa e dolorosa instabilidade político-social. Depois de Luís XVIII, Carlos X não conseguiu sustentar-se no trono e fugiu para a Inglaterra, em 1830. Luís Filipe I não teve melhor sorte; incapaz de superar a revolta popular de 1848, teve de abandonar o país, às pressas. O Governo Socialista que emergiu dessa revolução foi um completo fracasso e deu margem a que fosse eleito Presidente da França o sobrinho do Pequeno Corso, que não demorou a imitar o tio e logo se tornou o Imperador Napoleão III. Engajando-se em guerras sucessivas e após importantes vitórias políticas e militares, acabou sendo fragorosamente derrotado pelos prussianos em Reichshofen, Gravelotte, Saint-Privat, Metz e Sedan, onde caiu prisioneiro, no dia 2 de setembro de 1870. Apesar da heróica resistência oferecida, a Terceira República, então proclamada, não logrou evitar a queda de Paris e teve de ceder, como troféus de guerra, aos prussianos, a Alsácia e a Lorena, além do pagamento de uma indenização de cinco bilhões de francos-ouro. O rosário de dores estava, porém, longe de completar-se. O Governo Republicano teria, a seguir, sérias dificuldades, primeiro para dominar a insurreição denominada "Comuna", que rebentou em Paris, e depois para superar a ameaça monarquista dos partidários de Boulanger, além do escândalo do "Caso Dreyfus". Somente um século depois de Waterloo a França pôde, enfim, respirar aliviada; mas esse alívio duraria muito pouco, pois ela seria logo envolvida no conflito mundial de 1914.

Vivia a França as peripécias que assinalamos, quando o astuto Bismarck, após conduzir com extrema habilidade uma demorada e dificil estratégia de unificação dos Estados alemães, conseguiu, por fim, inclusive às expensas da França, da Dinamarca e da Austria, fazer proclamar, no palácio de Versalhes, no dia 18 de janeiro de 1871, a fundação do Império Alemão.

Nem só de França e Alemanha vivia, porém, a Europa. Na verdade, a mais próspera de todas as nações era então a Inglaterra, a grande marinheira, a banqueira do mundo; a Inglaterra vitoriana de Gladstone; a Inglaterra Imperial de Disraeli. Ela firmou o seu dominio sobre a índia; obrigou a China a abrir portos ao comércio com a Europa; fundou colônias na África; estabeleceu domínios na Ásia e na Oceania. Foi ela quem impediu que o Czar da Rússia esmagasse a Turquia; e foi ela que, pelo Tratado de Berlim, negociado por Benjamin Disraeli,em 1878, garantiu o reconhecimento da independência das nações balcânicas.

Uma outra grande nação surgiu também no século XIX: - a Itália, cuja unificação, preparada por Cavour, foi finalmente terminada por Vitor Manuel II, em 1870.

Ao permitir e incentivar a formação de grandes nacionalidades terrestres, através do agrupamento de coletividades espirituais afins, o Cristo Divino tinha em mira facilitar a aceleração do progresso humano e promover a divisão do trabalho, na Terra, em favor de um regime de diversificação de capacidades que gerasse uma economia de trocas e de interações culturais, com base na interdependência e na cooperação. Tão logo, porém, cada nação se viu senhora de certos patrimônios, começou a pretender, desavisadamente, o domínio do mundo. A Inglaterra, dona dos mares e de vasto império colonial, permitiu-se sonhar com o monopólio do comércio. A Alemanha, vendo-se possuidora de vastas reservas de carvão e aço, e dispondo de avançada tecnologia industrial, imaginou poder impor, pela força, uma hegemonia incontrastável. A França, orgulhosa de sua cultura e de sua intelectualidade, julgou-se com direito a ser a tutora dos povos. Os Estados Unidos e o Japão, animados com os seus êxitos econômicos, consideraram-se aptos a exercer uma liderança mundial mais efetiva. A Itália e a Rússia não faziam segredo de suas ambições imperialistas. A tal ponto as cobiças se desbordavam, que os preparativos para um grande conflito armado não precisaram mais de disfarces. A França, a Inglaterra e a Rússia celebraram um pacto militar chamado a "Tríplice Entente"; a Alemanha, a Itália e a Áustria-Hungria formaram, por sua vez, a "Tríplice Aliança". Um pretexto aceitável era, pois, somente o que faltava para que o conflito começasse.

Quando o príncipe herdeiro da Áustria-Hungria foi assassinado, a tiros, por um estudante sérvio, na capital da Bósnia, os austríacos exigiram da Sérvia reparações tão humilhantes, que a Rússia ofereceu aos sérvios o seu apoio. Considerando esse apoio uma provocação, a Alemanha declarou guerra à Rússia. Era o dia 1° de setembro de 1914 e estava iniciada a Primeira Grande Guerra. Dois dias depois, o conflito já se estendia à França e à Inglaterra. Em pouco tempo, o desforço bélico atingia também a Itália, a Bulgária, a Romênia, Portugal, os Estados Unidos e o Brasil, sem falar no Japão, que só entrou na guerra para apossar-se dos portos alemães no litoral da China e, satisfeito com o saque, retirou-se do conflito.

Corria acesa a guerra, quando ocorreu, na Rússia, a Revolução Socialista, que derrubou a monarquia e pôs no poder Kerensky. Este não se sustentou no governo, que foi tomado pelos comunistas de Lenine e Trotsky. O novo regime apressou-se a firmar a paz com a Alemanha, mesmo ao preço da cessão de vastos territórios, interessado em fechar as fronteiras do país, a fim de remodelá-lo.

Na primavera de 1918, os alemães, em franca ofensiva, estiveram a pique de tomar Paris e vencer a guerra, mas o maciço auxilio chegado dos norte-americanos proporcionou aos aliados recursos materiais suficientes para a resistência e para o contraque dos exércitos do Marechal Foch, que levaram a Alemanha, já exausta, a reconhecer a derrota. O Kaiser Guilherme II fugiu para a Holanda; a Bulgária, a Áustria e a Turquia se renderam e o Armistício foi assinado, no dia 11 de novembro de 1918.

O Tratado de Versalhes, firmado no dia 28 de junho de 1919, iria preparar o terreno, desde logo, para uma guerra futura. A Alemanha foi obrigada a devolver à França a Alsácia-Lorena; perdeu todas as suas colônias; teve o seu território cortado pelo famoso "Corredor Polonês". Surgiram a Hungria e a Tchecoslováquia. A Sérvia transformou-se na Iugoslávia. Ao lado da Rússia, foram instituidos a Finlândia, a Estônia, a Letônia e a Lituânia. Além disso, outras sanções foram impostas aos vencidos, pelos Tratados de Saint-Germain-en-Laye, Neuilly e Trianon.

As grandes injustiças sociais, a fome, a miséria das populações e a propaganda violenta de idéias reformistas e comunizantes acabaram provocando, na Europa, grandes agitações e propiciando o surgimento de grupos exaltados de extremistas. Na Itália, Benito Mussolini, pregando a união absoluta dos patriotas (varas) num poderoso feixe - fascio -, criou o Fascismo, prometendo reformas gerais, restauração moral, prosperidade econômica e um império colonial rico e vasto. Vitorioso em sua "Marcha sobre Roma", tornou-se, em 1922, Primeiro-Ministro, mas realmente assumiu de fato o governo ditatorial do país. A titulo de cumprir suas promessas, o Fascismo instaurou um regime de opressão e violência, colocando sempre os direitos do Estado acima dos direitos dos cidadãos; invadiu e subjugou a Abissínia, em 1936, e ajudou Francisco Franco a tornar-se ditador da Espanha, em 1939. Na Alemanha, Adolfo Hitler, também vitorioso, implantou o Nazismo, e, com a morte de Hindenburg, em 1934, enfeixou nas mãos todos os poderes de governo; anexou a Tchecoslováquia e a Áustria e, no dia 19 de setembro de 1939, invadiu a Polônia, iniciando a Segunda Grande Guerra.

Daqui por diante, a História é recente demais, dispensando-nos os registros, mas não podemos deixar de assinalar a eclosão, sob as vistas e os auspícios do Cristo, dos movimentos de libertação que emanciparam politicamente quase todas as nações africanas, preparando-as para significativas missões no próximo milênio.

Como já escrevemos, em página publicada sob assinatura do companheiro que me serve de instrumento de comunicação, paira no ar uma incerteza profunda. Um arrepio de maus presságios vara o misterioso arcano do futuro. Durante séculos a fio a Humanidade acumulou montanhas de ódios, e já a emanação sedimentosa dos pensamentos sombrios e ferozes se aglomera sobre a Terra, em espessas camadas superpostas e ameaçadoras, que lembram cirros virulentos e invisíveis. O monstro da destruição, por ela alimentado com tanta solicitude, rosna sanhudo à sua face, qual áspide principescamente criada para o assassínio traiçoeiro do seu dono.

O vendaval não tarda a desencadear sobre as valas torturadas do orbe a procela furiosa que se alimenta de sangue e que se banha nas lágrimas. Relegado o Evangelho do Cristo, olvidados os seus divinos ensinamentos, ergastulado no cárcere dos dogmas o espírito sublimado da sua Doutrina de Amor, que outra coisa poderia suceder à Humanidade desvairada, senão a completa bancarrrota dos seus princípios superiores, esmagados perante o esquife da justiça, apunhalada pelo egoísmo feroz, nos delírios da vaidade e da rapina?

Na orgulhosa presunção da sua trágica cegueira, o homem rejeitou a direção de Jesus, chafurdando-se no mar das experiências dolorosas do desvario e dos crimes. Agora, num crepúsculo agoniado de jornada, treme assustadiço ante os densos novelos de fumaça que sobem do monturo letal dos próprios erros!

Armados até os dentes, espreitam-se os povos, numa estranha dança de malabarismos fatídicos, temendo pela sorte. Os engenhos de destruição engendrados pelo homem ameaçam-lhe a própria sobrevivência e a dura necessidade de paz não consegue suplantar a fantástica miragem da luta de extermínio. Eis o salário da rebeldia humana! Eis o altíssimo preço da ambição!

A tormenta desabará. A Justiça Divina, que dá a cada qual segundo as suas obras, não susterá o automatismo da lei de causa e efeito, que o Espiritismo tão bem define e prega. A sementeira de maldades e ignomínias rebentará num oceano de frutos amargos de prantos e de dores, e o homem aprenderá, por fim, que o Evangelho do Senhor não é um conto de fadas, mas uma Lei de Vida, que ninguém pode violar sem funestas conseqüências.

Então, raiará para a Terra um Novo Dia. As lições maravilhosas de Jesus, vivificadas e restabelecidas em sua pureza original pela Terceira Revelação, regerão as manifestações do sentimento enobrecido nas forjas da amargura. Uma Nova Aurora despontará, fecunda, para este orbe triste e a aleluia de há dois mil anos ressoará, mais vívida e mais clara, nas quebradas dos nossos alcantis.

O Espírito do Bem reinará na alma dos homens. Cristo vencerá!

Espírito Áureo
tags:
publicado por SÉRGIO RIBEIRO às 01:46

mais sobre mim
pesquisar
 
Abril 2010
D
S
T
Q
Q
S
S

1
2
3

4
5
6
7
8
9
10

16


25
26


Últ. comentários
Excelente texto. Parabéns!
É como você mesmo colocou no subtítulo do seu blog...
Ok, Sergio.O seu e-amil é só esse: oigres.ribeiro@...
Ok, desejaria sim.
Ola, Sérgio.Gotaria de lhe fazer um convite:Gostar...
Obrigado e abraços.
www.apologiaespirita.org
Ola, Sérgio.Gostei de sua postagem, mas gostaria s...

SAPO Blogs


Universidade de Aveiro